O vatapá com pimenta na casa da baiana

E na noite do dia de antes de hoje fomos nós convidados para um vatapá en la casa de baiana Saionara. Nós e mais trezentos e o gato amarelim. E foi assim que Saionara nem havia tirado as caçarolas do fogo e já tinha cidadão chegando para se servir do rango, atraído pelo cheiro do cozido.

Enquanto o vatapá tapado descansava na panela, a anfitriã solenemente anunciou entre nós a presença do deputado estadual Lazinho da Fetagro, que acompanhado dos assessores especiais para Buritis, discorreu sobre suas ações e políticas para a Terra da Palmeira e estado.

A baiana de ouvidos e olhos no deputado, o deputado de ouvidos e olhos no povão e o povão de ouvidos no deputado e olhos no vatapá. Para fechar a cerimônia das datas e partir para os comes e bebes. Mas ainda faltava um alguém e ninguém se sentaria à mesa sem que antes esse alguém chegasse: Ele, o Alguém, Soberano da Terra da Palmeira, senhor absoluto do Alviverde de Valverde da São Lucas Roni Irmãozinho.

E para alegria da nação palmeirinda, Soberano chegou, falou das parcerias com o Lazinho depois de Lazinho, agradeceu e comeu vatapá. Aliás, todos comemos do vatapá. Inclusive o gato amarelim que veio achando que ia ter vatapá de rato. Fiquei esperando que alguém fizesse aquela máxima com o prefeito: "Prefeito, o senhor gosta de vatapá? ..." Ninguém fez.

Mas aí tinha lá em cima da banca dos comes e bebes umas garrafinhas com pimentas curtidas e, aproveitando um momentinho que minha esposa se descuidou de mim, aspergi um tiquinho no meu prato de vatapá. Escolhi a que tinha a carinha mais chifrim, mais desbotada, mas que era bem cheirosa. Dei umas boas pingadas no prato e, depois de me acomodar em um canto qualquer, me pus a degustar a iguaria. Gente do céu, pensa numa pimenta ardida!

Ardida mesma. E foi lágrimas escorrendo dos olhos, e foi lágrimas escorrendo do nariz. E foi garganta queimando. Chegou um momento que eu não sabia se chorava mais pelos olhos ou pelo nariz. Até o ar que eu respirava era apimentado... arre égua! Pensei: "Vai me faltar o ar, uai!" Desesperado, fui para um outro cantinho escuro, isolado dos demais viventes e tome água, tome refri... só retornei para a civilização depois de consolado para um "Tchau, obrigado pelo convite!" falado com a voz ainda embargada pelas emoções recém vividas.

Para sexta tem um chamado para o barracão do Onofre, mas não vai dar pra gente ir nessa dessa vez não. 

O gato amarelim: "Uai, eu pensei que ia ser vatapá de rato."

Fotos: Gecira Landi/Eu